terça-feira, 1 de julho de 2008

QUERÔ mais Plínio!!!

Plinio Marcos escreve sob o lado humano do teatro, mas não quer dizer que seja fiel a todos os problemas da humanidade. Prostitutas, traficantes, canalhas, cafetões e cafetinas, cais e sofrimento, muito sofrimento. Plínio foi o escritor da dor, da pobreza e do mau trato. Defendeu com unhas e dentes a situação dos menos favorecidos, porque ele era assim, um palhaço sem nariz. As dificuldades que viveu até se transformar no dramaturgo que foi e continua sendo para estudantes de arte, diretores ou apenas apreciadores do teatro e da magia que ele representa, refletiu em todas as histórias que contou. Ainda bem que Plínio não seguiu os caminhos que seu pai, o bancário Senhor Armando queria.

Plínio demorou dez anos para concluir o primário e quando terminou não fez mais nada, mas foi com as palavras que conquistou seu espaço, foi contando o que via que se transformou em um dos principais ícones do teatro brasileiro e acrescento ainda que Plínio foi um cara moderno.O palhaço Frajola se destacou na multidão como “o cômico mais querido de Santos” e virou Plínio Marcos, o dramaturgo mais odiado do País, ou um dos mais. Plínio falava dos problemas sociais com a mesma transparência que poderia falar sobre as compras de mercado, porque no fundo, sabia realmente para quem estava falando, quem queria atingir com cada palavrão que escrevia. Assim Plínio viveu, falava de dor porque sofria, falava de dificuldades, porque ultrapassou muitas. Escreveu sua primeira peça depois de uma história que ocorreu em Santos, litoral de São Paulo e cenário da maioria dos seus textos.

A história? “um garoto foi preso por uma besteira e, na cadeia, foi currado. Quando saiu, dois dias depois, matou quatro dos caras que estavam com ele na cela”. Era essa a realidade diária de Plínio e foi com ela que escreveu todos as peças de sua obra teatral.Tudo bem, se for falar tudo que me encanta no Plínio, esse post não acaba mais. Então, vou falar sobre o que realmente me fez começar esse texto. O cinema.

Hoje, domingo, muito calor em Brasília, tempo seco e uma preguiça que sinceramente não iria me tirar de casa. Mas, alguém conseguiu me levar ao cinema depois de muito tempo. Foi mais ou menos assim: “vai fazer algo a tarde?” e eu: “vou ao mercado comprar água (nunca tem água em casa) e depois não vou fazer nada” e meu amigo: “vou ao cinema, vamos?” e quando ele disse “to pensando em assistir QUERÔ” logo respondi: “topo demais” e fui mesmo. Saí de casa mesmo com preguiça física e mental, mas cheguei até a Academia de Tênis feliz e contente.O filme retrata com realidade e fidelidade o autor da obra, claro, o Plínio. Versão fiel da realidade dos meninos santistas que vivem no cais. O porto de Santos é a casa desses menores e a Febem a fuga. Ninguém tem nome, eles têm apelidos. Querosene, mosca, sabará, taco de ouro. São eles que fazem do filme do diretor Carlos Cortez um meio de reflexão sobre o preconceito social. Mas, não quero filosofar sobre os problemas sociais do País, isso é dito todos os dias. Quero falar de QUERÔ.

Quero deixar aqui minha visão sobre os noventa minutos que não me deixaram desconcentrar.Não vou falar sobre técnicas, mas quero parabenizar os atores e toda produção. A realidade do filme foi construída com pessoas que conhecem a realidade contada. Os personagens principais foram escolhidos dentro das comunidades mais pobres de Santos e acredito que esse foi o ingrediente principal para QUERÔ ir ao cinema. É diferente você ler o texto e assistir o filme, porque com o livro você imagina o que quiser, principalmente se não conhece Santos e a pobreza em que vive a periferia santista. No cinema, toda minha imaginação foi concretizada, não apenas por conhecer o cais ou o centro velho de Santos, mas por mostrar nos olhos dos personagens toda sensação que senti quando li o livro.

Fiquei atenta a cada detalhe e a todo momento pensava: “agora ele volta para Febem de novo” e essa sensação de ansiedade pela primeira vez não me incomodou, pelo contrário, fez com que eu ficasse mais “ligada” ainda. O olhar de raiva e ódio do ator Maxwell Nascimento me cativou e me fez lembrar das vezes em que parava no semáforo na avenida portuária e algum pivete vinha pedir dinheiro. Engraçado, era sempre o mesmo olhar, um olhar de raiva e pedido de socorro ao mesmo tempo. Hoje, depois de ver o filme, parece que vi todos os rostos de todos os meninos que um dia disseram: “tia tem uma moedinha ae?” ou então: “descola um rango pra mim tia?”.Não preciso nem dizer que me emocionei, não apenas por ser um texto de um dos meus autores favoritos, mas por me levar de volta num mundo que participei como coadjuvante durante dez anos. Fique emocionada por ver nos olhos de cada personagem, a dor e alegria de ser o que é, já dizia Fernando Pessoa.

Tenho certeza de que o dia em que voltar em Santos, passarei novamente pela avenida portuária e tenho certeza que encontrarei muitos QUERÔS e o que vai acontecer? Depois eu conto. Ironia ou não, meu retorno será no dia das crianças, mas isso talvez seja assunto para um próximo post.Vou ficando por aqui, nesse domingo quente e afirmando mais uma mais.

Quero mais Plínio, QUERÔ mais!!!!

“para incomodar os que estão sossegados, é por isso que faço teatro”Plínio Marcos

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